Pra que lado eu vou?

Diogo Hartuiq Debarba
2 min readAug 19, 2021
Um céu azul com nuvens espalhadas em linhas como se fossem rastros de jatos e um sol bem branco no centro superior da imagem.
Pra que lado eu vou? — Diogo Hartuiq Debarba — Foto de @Ryutaro Tsukata

Estava dentro de um ginásio de esportes,

sentado em uma cadeira plástica quase no meio da quadra,

as solas de meu chinelo tocavam o chão pesadas e aparentemente imóveis,

reparei no fundo do lugar que portas haviam sumido,

eu frequentava esse lugar quando criança,

com as portas desaparecidas parecia outro lugar,

ao lado também sentado em cadeira de plástico branca,

um rapaz vestido de uniforme verde de supermercado mexia seu pé como bocas de formiguinhas beliscando um pedaço de comida,

achei que ele estava ansioso de chegar sua vez de ser picado,

meus pés eram como pés de elefantes ou daqueles gigantescos dinossauros pescoçudos,

não gastaria minha energia à toa por causa de uma vacina,

mas me equivoquei, ou o rapaz já tinha tomado sua dose,

ou só aguardava sua companheira mesmo,

porque ela voltou com a mão segurando o braço e manga da blusa puxada para cima,

e ele logo se levantou e foi até ela a engatando em seus braços a levando para fora de quadra,

82, era quase eu,

83, me levantei sem nenhum esforço porque meus pés já conheciam o chão e não batiam asas inquietos como os do rapaz,

me sentei na cadeira e a moça foi gentil comigo, perguntou minha idade,

lhe disse 26,

perguntou se tomei vacina nos últimos 15 dias,

disse que não,

perguntou se eu tinha o cartão de vacina,

disse não,

perguntou até meu nome,

o que foi estranho por ela tinha minha identidade em suas mãos,

mas respondi mesmo assim,

me lembro dela, era uma moça que eu achava muito bonita quando fui criança,

não achava mais, porém ainda gostava dela por ela ser tão gentil comigo,

então senti uma picada gelada no braço, e continuei conversando com a moça e respondendo as coisas,

ela me devolveu meus documentos e disse que teria que voltar lá, me falou o nome da vacina que tomei que não lembro, e que estava tudo certo,

agradeci e a enfermeira comentou com a outra que o pote de seringas estava começando a esvaziar de novo,

ela já deve ter furado muita gente, já eram mais de meio dia,

sai e o sol também foi gentil comigo e me esperou lá fora,

mas estava quente lá dentro e não dei tanta importância para o seu calor,

então é assim, eles picam a gente e vamos embora,

e ficamos parados com o braço doendo sem entender nada como ratos de laboratório,

não nos dão nem uma balinha de iogurte e nos apontam para que lado da rua temos que ir,

bem que me disseram que esse presidente não entende de nada das coisas.

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Diogo Hartuiq Debarba

Eu? Uns tantos, Um tanto de literatura, Um tanto de pintura, Um tanto de palhaço, Um tanto de música, Um tanto de tecnologia, Mas também paro, Para ser nada